Android para espíritos livres
Apesar da infraestrutura básica ser livre, a vasta maioria dos dispositivos Android está longe de fornecer a mesma liberdade de sistemas operacionais baseados em Linux para computadores de mesa. Os dispositivos que chegam às mãos da vasta maioria dos consumidores contém controladores proprietários para vários componentes (sensores, moduladores, câmeras, rádio, GPS, GPU e por aí vai). Isto sem contar as tranqueiras embutidas por diversas empresas na cadeia de produção e distribuição, desde fabricantes até telecomunicações.
A melhor opção para quem quer um aparelho relativamente livre, mas ainda assim altamente funcional, é instalar alguma distribuição alternativa derivada do AOSP. A mais madura e popular dentre elas é, certamente, LineageOS.
A gama de aparelhos suportados não é muito ampla, porém é comum que um ou outro dispositivo comercializado no Brasil esteja na lista, ainda que apenas disponível no mercado de segunda mão, com destaque para aparelhos Samsung com circuito integrado Exynos. O meu aparelho, por exemplo, é um Samsung Galaxy A5, o qual comprei já usado em 2019. Entrou no mercado em 2016, portanto deve estar completando mais de seis anos de uso. Provavelmente teve a bateria trocada antes de chegar na minha mão, mas eu mesmo nunca o fiz. Minha expectativa é mantê-lo ainda alguns anos, pois satisfaz todas minhas necessidades e, por causa do LineageOS, dispõe de um sistema operacional mais atualizado (Android 11) do que muitos aparelhos novos vendidos hoje.
A questão crucial, naturalmente, é o que esperar de um aparelho antigo com LineageOS. Em primeiro lugar, certamente não é uma boa para quem usa intensamente (por exemplo, com jogos e entretenimento). Mesmo que as capacidades técnicas ainda satisfaçam, a bateria teria que ser substituída com certa frequência, uma tarefa propositalmente difícil nos dispositivos modernos. Pode ser uma excelente alternativa, porém, para quem usa primariamente para se comunicar, informar e organizar. O sistema operacional pode ser atualizado para muito além do suporte oficial do fabricante, além de proporcionar um manuseio mais enxuto, agradável e flexível. Sem mencionar o impacto positivo na redução de refugo eletrônico.
Eis algumas dicas para quem dispõe de um dispositivo antigo com LineageOS. Algumas delas, entretanto, são aplicáveis ao ecossistema Android em geral.
Tema escuro
O componente que mais suga energia é, sem sobra de dúvida, a tela. Se você possui um dispositivo com tela AMOLED, é possível obter uma economia considerável de energia ao empregar temas escuros. Inclusive, muitos aplicativos, e mesmo o próprio Android/LineageOS em suas versões recentes, dispõe de temas especificamente calibrados para a economia de energia nestas telas, conhecido como “tema AMOLED”, “tema preto (puro)” ou algo que o valha. Para escurecer o conteúdo das páginas no Chrome, acessar chrome://flags
e habilitar #enable-force-dark
(Auto Dark Mode for Web Contents). No Firefox, existe um complemento.
Pareamento com o computador
Além do tema escuro, outra maneira de poupar o uso da bateria é manter a tela desligada, sempre que possível. Para algumas pessoas, não é incomum ter o celular consigo enquanto trabalham em um computador, com uma tela maior. Nestas situações, é possível evitar ligar a tela do celular para conferir notificações e etc. mediante a sincronização com o computador. Pessoalmente, eu uso o KDEConnect.
Automação
LineageOS já vem com algumas funcionalidades que permitem automação. É possível definir perfis de sistema que são ativados de acordo com certos critérios. Por exemplo, um perfil pode ser configurado para que o aparelho ative os dados móveis ao desconectar da sua rede sem fio doméstica. Ou para silenciar o aparelho ao chegar em casa e conectar na rede sem fio doméstica. Assim, evita-se tarefas repetitivas ao mesmo tempo em que a bateria é economizada, na medida em que é poupada a ativação da tela.
Para além daquilo embutido no sistema operacional, aplicativos como o Easer oferecem ainda mais amplitude de automação.
Respaldo
Existem várias maneiras de se resguardar contra desastres que não requerem uma conta com a Google. Estratégias manuais são: usar o sistema de recuperação, ADB, ou mesmo rsync.
Seedvault promete um método mais automatizado e já vem embutido em versões mais recentes do LineageOS.
F-Droid
Nenhuma discussão sobre ferramentas livres para Android estaria completa sem mencionar F-Droid. Os aplicativos distribuídos pelos repositórios padrão são vetados com respeito à segurança, liberdade e privacidade. Vários metadados importantes para o usuário estão visíveis antes da instalação, algo que só recentemente tem sido adotado pela loja de aplicativos da Google. Alguns aplicativos disponíveis via F-Droid não estão disponíveis na loja da Google. Mas mesmo aqueles que estão disponíveis ficam enterrados nas buscas, pois a Google possui um interesse financeiro em promover alguns aplicativos em detrimento de outros.
Alguns aplicativos interessantes:
- Wasted, Duress: para situações como as vividas por Darlene Alderson
- Yet Another Call Blocker: nome autoexplicativo
- WiFi Analyzer: para quem configura roteadores antigos ocasionalmente
- Phyphox: para tirar real proveito dos múltiplos sensores no seu aparelho
- Semitone: para quem estuda música
- NewPipe: interface para PeerTube, dentre outros
- Termux: SSH, Python e Emacs que cabem no bolso; Darlene também usa